terça-feira, junho 26, 2007

Gastrónomos do Erário

Ontem, no blogue de Eduardo Pitta:

"Abre hoje no CCB o Museu Colecção Berardo. O acervo exposto inclui 245 obras, das 862 da colecção do comendador. Para manter o museu, o Estado vai gastar três milhões de euros nos primeiros doze meses de funcionamento. Só hoje, o happening — inauguração oficial [18:30h], jantar para 800 convidados nos Jerónimos, fogo de artifício para o povo — está orçado em seiscentos mil euros." - O colorido é desta casa.

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segunda-feira, junho 25, 2007

Bacalhau confitado sobre queijo de cabra e broa

Voltei à cozinha criativa, salvo seja, que não sou nenhum Ferran Adrià, mas também lhes digo que já tenho comido bem pior do que aquilo que faço em restaurantes portugueses, e não só, que ostentam na sua publicidade a oferta de cozinha de autor, agora tão na moda no nosso cantinho à beira-mar, que já não é cantinho nenhum e muito menos jardim, é um amontoado de silvas, que não tarda comecem a dar as amoras de que tanto gosto. De silvas e de esmifradores de impostos sabe-se lá para quê ou para quem.

Mas deixemos de falar de coisas arreliantes, e vamos a este excelente método de fazer o bacalhau, que me foi ensinado pelo chefe do Hotel Guimarães, desta dita cidade. Além de não se ter pena do azeite, é preciso um termómetro que, mais uma vez, aconselho a comprar.

Cortei em duas e aparei uma posta de lombo do infiel amigo.


Pus meio litro de azeite num púcaro de aço inox, levei-o a aquecer até aos 70ºC e mergulhei neles os lombos. Juntei mais azeite até cobrir o bacalhau.

Deixei de novo subir a temperatura e, em lume mínimo, no bico mais pequeno (mais fraco), fui mantendo a temperatura entre os 68 e os 72 graus durante 10 minutos apenas, ora tirando, ora pondo sobre o lume.


Entretanto fritara rodelas finas de cebola e salsa, a cebola até ficar como na imagem de abertura, a salsa só coisa de segundos, ambas ficando estaladiças. Tinha assado também uns tomates-cereja no forno. Esmigalhara miolo de broa e cortara falhas de queijo de cabra de Trás-os-Montes, curado, que devem, no entanto, ser mais grossas, coisa de 1 mm, para se sentirem melhor. Empratei a base como se vê na imagem, com a ajuda de uma forma. E dispus em cima o bacalhau, que retirei do púcaro, ao fim daquele tempo, com grande cuidado e regando-o com o mesmo azeite. Enfeitei com os vegetais que tinham um papel mais importante que apenas o da vista. A cebola fazia uma ligação excelente com o tema central do prato, a salsa tinha um crocante delicado e o tomate-cereja fornecia acidez ao conjunto. A broa dava a nota portuguesa ao prato (e o gosto da cebola), e ficou muito bem, molhadinha no azeite.

A excelência deste método reside na formação de lascas perfeitas, como se pode ver na imagem acima, na gordura do próprio bacalhau que tão bem se conserva, repare-se no brilho dela nas lascas, que não é do azeite, e, com isto tudo, o rigor do ponto de cozedura atingido. Estava de se rezar a Deus e faz-se num ai.

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terça-feira, junho 19, 2007

Ainda sobre o arroz de cabidela

A uma pergunta nos comentários, que agradeço, vi que me esquecera de dizer porque, no arroz de cabidela, estufara a galinha antes e da maneira como o fiz: primeiro dourei-a no azeite e só depois lhe juntei a cebola, o alho, a seguir a seguir o alho e a salsa, a. A partir daqui foi estufada muito lentamente. Procedi assim para reter mais o sabor na própria galinha, quer selando-a (dourando-a) primeiro só em azeite, evitando assim rapidamente a saída dos sucos da carne, quer estufando-a à parte e só no final a acrescentando ao arroz. Usei depois o caldo feito com a carcaça, o molho do estufado e o resto, para compensar a perda de sabor que o estufado retém na peça estufada. Intensifiquei pois o sabor em ambos os componentes, do que resultou um arroz muito saboroso.

Normalmente, guisa-se a ave sobre um refogado, junta-se a água necessária e faz-se o arroz como de costume. O sabor neste modo de fazer sai menos intenso. Tenho, para meu uso, que é muito mais vantajoso aperfeiçoar pratos de cozinha tradicional, sem os desvirtuar, do que seguir receitas à risca e acriticamente.

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Variante de uma variante de fazer polvo


Tinha no frigorífico uns tentáculos de polvo cozido que me deram a ideia. Pus três batatas inteiras sem casca numa panelita com água e sal, e acendi o lume. Entretanto, como parece que gosto de tornar os pratos mais trabalhosos, fiz umas brasas bem acesas e deitei-as, vivíssimas, num púcaro de inox cheio de azeite aquecido. Aquilo até parecia coisa de bruxas. As brasas engalfinharam-se com o azeite, por um momento não queriam ir para o fundo, estrilharam e fumegaram, até que o fumo se desvaneceu e a superfície do azeite ficou em paz, como o mar depois de engolir um barco: escuro e liso, sem se ver nada. Consegui assim um azeite a saber a fumeiro, coisa que li não sei onde e que dá jeito.


Parti as batatas às rodelas de 5 mm de espessura e o polvo mais ou menos igual.


Dispus as rodelas de batata no prato refractário e, sobre elas, as de polvo.



Reguei tudo com o azeite de aroma a fumeiro, temperei o polvo com flor de sal e levei o prato ao forno a gratinar levemente. Polvilhei o polvo com pimentão doce de La Vera, que sabe também a fumo, pus um pouco de salsa bem picada e consolei-me a comer e a ver o azeite fervilhar. O sabor a fumeiro do azeite e do pimentão fez uma ligação esplêndida com o polvo.


É uma variante de outra variante do polvo à galega, que costuma servir-se cozido e assim às rodelas, sozinho, sobre uma tábua, ou então com batatas cozidas na própria água do polvo. A variante, que saboreei num restaurante galego de Madrid era como esta, as batatas cozidas em água, mas o prato sem ir a gratinar, sem o azeite aromatizado, sem salsa e com um pimentão normal, que não tem o aroma a fumo como todos sabemos.

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domingo, junho 17, 2007

Arroz de cabidela de galinha em slow food

Não sei como se pode demorar mais de 4 horas a fazer um arroz de cabidela, das 10:30 às 15:00. Foi quanto me demorou este. Eu e a minha mania das perfeições. Definitivamente, não servia para cozinheiro. Nem a queda me safava. Morria de fome com os tachos ao pé, como Tântalo de sede à beira de água. Também ninguém corria atrás de mim e do arroz, e se corresse, eu estava com a tineta de o fazer como pensara, que é exactamente como aqui vai, e de nada valeria a pressa.

Primeiro fiz o caldo com a carcaça da galinha igual às que costumo usar, muitíssimo mais saborosas que o frango do campo. Juntei um bom osso de presunto, meia cenoura, salsa, dois dentes de alho esmagados, uma colher de sobremesa de pimenta preta em grão. Deixei ferver o que deveria ter sido 3/4 de hora e passou de 1 hora, o que não fez mal nenhum. Receitas são receitas, tenho um livro (Larousse de la Cuisine) onde reza 45 minutos, mas não devemos, em cozinha, fazer muito caso destas coisas. Menos é que não, e isso entende-se porquê.

Desengordurei o caldo bastante mais tarde, já com o molho da galinha misturado, tendo tido o cuidado de deixar alguma gordura. O copo estava cheio até ao cimo. O que falta na imagem acima foi a gordura retirada.

Pedi no supermercado, onde compro as benditas galinhas que tanto bem me fazem à alma , pedi, dizia, para me cortarem parte dela como se vê sobre estas palavras.

Levei um tacho ao lume com azeite e fui alourando, bem alourados, os pedaços já temperados de sal.

Entretanto, picara miudamente, como se vê, meia cebola e dois bons dentes de alho, cortei umas rodelitas de uma belíssima chouriça que tinha há mais de um ano em azeite (que boa está!), e meia folha de louro sem a nervura (toda a gente a tira e por isso também o faço, mas saber porquê, isso não sei. No entanto, se vir uma fila de gente à espera de vez para se atirar a um poço, não me meto nela. Donde já devia ter procurado - e testado - a razão de tal coisa, que até parece superstição)
Enfim, deitei tudo no tacho, onde a galinha já estava bem alourada, mexi e tapei. Fui mexendo e tapando, até ver que a cebola estava puxada e só havia gordura, e depois fui deitando uns golinhos de água, e renovando-os quando se evaporavam. Estive nisto mais de 2:30 h, de certeza.


Para o fim fui-me preocupando em deixar algum molho para o misturar no caldo, e assim reforçar o sabor do arroz.

Retirei a galinha quando a dei por estufada para um prato e reservei-a.

Entretanto, como não tinha arroz carolino em casa, comprei um pacote de grão grande. Com a galinha, trouxera também uns ovos daqueles da canja, e cozi-os à parte, e um pacote de sangue de frango do campo, ou que vem com ele, o que na prática é o mesmo.


Misturei, como disse, o molho do estufado ao caldo e, para duas chávenas de arroz bem cheias, usei 8 chávenas de líquido, contando com a água que o sangue traz. Ferveu um pouco menos de 18 minutos, deitei o sangue e vinagre de vinho tinto a gosto, deixei apenas levantar fervura e desliguei o lume. Pus a galinha dentro do arroz, que descansou ainda 5 minutos antes de se comer.
Estava de se lamber os beiços, salvo seja, que isso é coisa de bichos. O Dão tinto Casa de Santar 2004, com 13,5º, estava bastante bem, e ainda foi melhor com o queijo de cabra transmontano, um queijo excepcional que descobri há tempos e que me era vagamente familiar. Lembrei-me depois de que havia uns semelhantes em Mirandela, onde fiz o meu estágio.

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quinta-feira, junho 14, 2007

Callos con garbanzos - Dobrada com grão


Tem ido um inverno desagraçado, e hoje a vida deixou-me o dia quase livre, de modo que foi este o meu almoço, um almoço que no fim me pôs a transpirar, já não era coisa que se comesse para o tempo que, convenhamos, não é tão invernoso como eu disse, nós é que teimamos em andar vestidos à Verão. E transpirar, transpirei. Ainda por cima, bebemos do mesmo tinto da Quinta da Canameira de domingo passado, potente e quase negro, com 13,5ºC, mais de mastigar do que de beber, isto é uma frase idiomática, não liguem, é só de beber, claro, e com todos os sentidos despertos, como mandaria Zeus na infinita lascívia com que os gregos antigos o criaram, imaginando-se a eles mesmos assim e ansiando-se iguais à sua própria obra. Também se compreende que não poderia ser de outro forma, penso eu, com um mar tão azul como aquele, com um sol tão intenso, com as cigarras a atroar de vida.

Mas onde eu já ia! Daqui a nada estava a contar a história do engano de Dánae. Vamos mas é aos callos con garbanzos, prato tão rústico quanto excelente, de que gosto muitíssimo. Quando o encontro numa lista de restaurante, nem hesito. Hoje é um prato nacional de toda a Espanha, muito provavelmente com origem na Andaluzia, sabe-se lá se desde o tempo do Al-Andaluz, digo isto porque em Marrocos se come um prato parecido, a diferença é que as tripas são de carneiro e os temperos mais complexos. Resta descobrir quem trouxe para a Península Ibérica o grão-de-bico, que veio do Oriente. Os fenicios, os gregos, os árabes, os próprios navegadores do séc. XVI? E eis-me de novo a derrapar no chão da cozinha. Não há maneira de o evitar, está visto. Escrever é um vício. Vamos lá então às coisas do estômago, um dos nossos lugares de prazer, ia pôr um dos nossos pontos erógenos, o que não estaria mal de todo no tempo do machismo mais sem vergonha, em que se dizia que a mulher conquistava muitas vezes o homem pela barriga. Falta saber de qual dos dois seria a barriguinha.

Mas comecemos, senão nunca mais desencalho.

O que levou para duas pessoas, eu e o meu ajudante do costume.

400 g de dobrada já cozida.
580 g de grão-de-bico de lata (prefira sempre o cozido em casa).
6 rodelas de chouriça alentejana de porco preto.
1 pedaço de presunto gordo às fatias (uns 100 g).
1/3 de pimento vermelho partido miudamente.
1 tomate menos que médio, picado, comn casca e sementes.
1/2 cenoura às rodelas.
1/2 cebola média picada.
2 colheres de sopa rasas de frainha de trigo.
Pimentão doce (usei o de La Vera).
Pimenta preta do moinho.
Cominhos a gosto (no meu caso foi a quantidade necessária para não passarem de bastante discretos).
2 dentes de alho .

Azeite, q.b.
Pasta de tomate em tubo (para ajudar a dar cor), q.b.

Não segui nenhuma receita, consultei algumas, e fiz como me parecia bem, usando ingredientes e um modo que não vi em lado nenhum. Foi por isso que classifiquei este prato como recriação.

Refoguei a cebola no azeite com o pimento e a cenoura. Quando a cebola estava transparente, já quase a alourar, juntei o alho laminado.

A seguir pus o tomate, que deixei desfazer-se, e depois a farinha, e o refogado ficou a apurar em lume brando.

Juntei depois água quente e deixei ferver uns 15 minutos em lume vivo para o caldo tomar o sabor do puxado, já com pimenta preta do moinho e os cominhos.


Coei o caldo para o tacho (limpo), levei ao lume para levantar fervura, pus metade do pimentão doce.

Juntei a dobrada, a chouriça e o presunto gordo às fatias. Acrescentei-lhe uns 10 cm de tomate concentado de bisnaga. Mexi, e fervilhou uns 20 minutos.

Acrescentei o grão, previamente passado por água para retirar o líquido em que vinham. Esmaguei uns quantos para engrossar um pouco mais o caldo e dar-lhe mais o sabor do legume. Deixei apurar e tomar gosto, coisa de um quarto de hora. Quase no final pus o resto do pimentão, para que ficasse a saber mais a ele

E toca a comer, que já passava das 2:00 h da tarde. Com colher de sopa, como o comem em muitos lados.


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domingo, junho 10, 2007

Bifes do acém na brasa com molho mirandês

Agora ando virado para comeres mais deste nosso mundo. A imaginação também exige - depois de se imaginar - muito trabalho e, francamente, trabalho é coisa que me sobra e que falta a muitos que ganham a vida sem ele. Mas não é só isso, nem sequer é principalmente isso. É que sou dado a ondas. A onda das compotas (a que este estou a torcer o nariz este ano), a onda dos licores, a onda da cozinha criativa, que agora me parece mais na gaveta - até um dia destes.

Assim, foi um fartar vilanagem hoje ao almoço, com dois bifes do acém de 650 g cada e 2 cm de alto, dos cinco que pedi para me cortarem com a altura do meu dedo polegar e que pesaram no total 3,5 kg, sendo portanto os outros três que ficaram mais avantajados. A 6,20 €/kg não se pode dizer que seja um exagero para os tempos que correm, exagero é o peso deles. Também pelo preço destes dois, nem dava para comer uma reles chulipa de novilho num restaurante manhoso.

Pensara nuns bifes um pouco à Padre Piedade, no entanto, mais uma vez, a pouca vontade de trabalhar me empurrou para uma solução mais simples.

Enquanto o meu precioso ajudante acendia o carvão numa pequena churrasqueira que comprei trasanteontem no Lidl por menos de 4 € (salvo erro), pus, sem pena, azeite mais que extra virgem de Foz Côa no fundo de uma caçarola, laminei 4 dentes de alho, e levei-a ao lume para levantar fervura e deixar fritar um pouco os alhos sem aloirarem. Juntei então, em relação ao azeite, mais ou menos 1/3 de vinagre tinto homemade (ficou como se vê na imagem acima), temperei com sal fino e fui agitando sempre a caçarola sobre o lume para que o vinagre se reduzisse para cerca de 1/3 da quantidade original. Pus de lado.


Prefritei, melhor, precozi na fritadeira, em óleo novo, uma batatas aos palitos grossos, e porque eram aos palitos grossos de batatas novas, e ainda por cima mais próprias para cozer (de polpa mais dura), baixei a temperatura aí para uns 130ºC, com o que me daria muito bem.


Com as brasas bem vivas e bem junto a elas, levei os bifões a grelhar uns 2:30 minutos de cada lado. Tiraram-se para fora, temperaram-se com flor de sal, puseram-se na travessa de serviço, e ficaram a repousar, enquanto se fritavam agora as batatas a 180ºC e se aquecia o molho. Deitou-se o molho a ferver sobre os bifes e dispuseram-se as batatas fritas na travessa.


Et voilà! Souberam pela vida, acompanhados de um belo Quinta da Canameira tinto 2004, de 13,5º (Douro), da mesma quinta do azeite que neste blogue se usa.

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domingo, junho 03, 2007

Sopa fria de tomate com hortelã e ovo

Tenho um palpite que este Verão vai ser muito mais dedicado que o anterior a imaginar e a executar sopas frias. Esta foi o meu jantar de hoje, um dia de calor e sede que nunca mais saciava, até comer esta sopa gelada, rica em sais minerais, com a frescura da hortelã, da própria temperatura e da ligeira acidez do tomate.


O que levou:

Tomate de rama muito maduro cortado aos pedaços (com pele e sementes) - 700 g
Alho francês às rodelas finas - 1
Batata média - 1
Ovos para cozer - 2
1 rodela de salpicão.
Azeite para o refogado - q.b.
Ramos de hortelã - 2
Açúcar - 1 colher de chá
Sal e pimenta preta do moinho - q.b.

Amaciei o alho francês no azeite de Foz Côa e retirei do lume.

Adicionei metade da hortelã e o tomate em bocados ao alho francês, bem como a batata e temperei de sal e pimenta preta do moinho. Deixei estufar uma hira ou mais, e fui juntando uns goles de uma canja de frango que estava no fogão.

Levei tudo ao copo misturador, com a metade da hortelã que reservara.


Liquefiz tudo


e passei por um coador, que devia ter sido o chinês se o tivesse encontrado. Rectifiquei de sal. Obtive assim 700 ml de sopa, suficiente apenas para duas pessoas. Deixei-a arrefecer, juntei-lhe umas pedras de gelo e pu-la no frigorífico. Bem gelada, fazia uma óptima ligação com o ovo cozido. Creio que ficará melhor com atum de conserva do que com salpicão, que também não foi mal.

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